Amigos em Maputo: "Estamos num barco sem comandante"

De antigos colaboradores a jovens artistas, as artes africanas reagem à morte de um dos seus símbolos.
Publicado a
Atualizado a

Amigos e colegas de Malangatana Valente Ngwenya no mundo da arte consideram-se "desamparados" com a morte daquele que foi o seu grande mestre nas artes plásticas, na dança, na música, no teatro e na poesia. "Estamos num barco sem comandante" , diz Noé Langa, artista plástico e amigo pessoal do finado. "Mesmo assim, vamos continuar a remar. Como ele próprio dizia em vida, não é com a morte de uma andorinha que podemos ficar sem a primavera", declara

Noé Langa cursou Artes Plásticas em 1960, juntamente com Malangatana, na Escola Mouzinho de Albuquerque: "Agora vou ter que aprender a ser homem porque já não tenho quem me oriente. Vou procurar usar os seus ensinamentos e passar testemunho aos artistas mais novos", conta.

Por sua vez, Lindo Hlongo, também artista plástico, que conviveu durante anos com o falecido homem de arte, considera a morte de Malangatana como sendo "uma perda irreparável".

"Ele era tudo. Praticava a dança, a escultura, a poesia, o teatro e a música e identificava-se com a população", disse. Hlongo lançou um apelo à família Nguenha para que saiba gerir da melhor forma o seu legado cultural.

Chalucuane Langa, um jovem artista plástico que cita Malangantana como influência, disse que o pintor o ensinou a trabalhar sem olhar para os ganhos financeiros e, acima de tudo, a praticar uma verdadeira arte.

"Um minuto de conversa com Malangatana equivalia a um semestre de aulas numa escola", sublinhou, "Nós, artistas, temos que nos inspirar nos seus ideais. Temos que nos erguer, unirmo- -nos e trabalhar no sentido de proteger as suas obras", defendeu, acrescentando que essa tarefa cabe também a todos os moçambicanos.

Por seu turno, o conceituado artista plástico moçambicano Naguib diz que a sua morte representa uma grande perda para África em geral. "Ele simbolizava a cultura moçambicana. Era sociólogo, antropólogo, musicólogo e até foi curandeiro. Enfim, foi um homem multifacetado", considerou.

Naguib teve o primeiro contacto com as obras de Ngwenya em 1963 e 1964 e conheceu-o pessoalmente após a independência de Moçambique, em 1975. "Discutíamos muito sobre as artes plásticas e ele dizia-me que a pintura não estava na tela, mas na cabeça do artista", diz.

Contou também que uma das coisas que mais o impressionavam no relacionamento com Malangatana, como pessoa, era a sua humildade. "Ele dizia que o artista que não é humilde deixa, automaticamente, de ser artista".

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt